Wednesday, January 2, 2013

Não tinha teto, não tinha nada. Daí eu passei horas, muitas

Não tinha teto, não tinha nada.

Daí eu passei horas, muitas horas, visitando propriedades para locação.
Num ataque de gentileza socialmente convencionada, aceitei o convite para acompanhar uma amiga em sua procura por uma casa nessa região. Nas províncias froteiriças.

E o que eu achei que seria muito maçante acabou revelando um outro lado, mais humano. Foi um pouco chato também, claro, porque é cansativo entrar e sair de casas vazias, todas elas cheias de possibilidades, segundo seus corretores. Aliás, corretores de imóveis, que categoria! Publicitários em potencial, é o mínimo que posso dizer. Bem ao lado dos vendedores de carros, mas isso é uma outra conversa.

O lado humano. Todo mundo precisa de uma casa. mesmo que não seja "o" objetivo da sua vida, aquele lugar pra chamar de lar, todos precisamos de um teto sobre a cabeça. Por estudo, trabalho, casamento ou impulso (individualmente ou tudo junto) cedo ou tarde a gente precisa de um lugar pra pernoitar. É fato. Mas então, aquelas casas todas. Muitas são feitas única e exclusivamente para venda ou locação. Paredes limpas, de sujeira e de história. Algumas me divertiram com suas referências cruzadas, seus rococós pós-modernos, como se isso fosse possível. É estranho entrar em construções que obviamente têm a mesma planta e deliberadamente ostenta detalhes "diferenciais". Porque ninguém quer um condomínio de aparência massificada, fria. Daí a função dos detalhes exclusivos, como aquelas colunas greco-romanas. Na garagem.

Minha amiga torceu o nariz pra todas as casas que classificou como "velhas". Ou seja, que já foram habitadas anteriormente. Porque sempre sobra um móvel, uma marca no azulejo. Coisas escritas em letras muito pequenas nos quartos - eu vi dois corações com flechas. As pessoas ainda usam desenhar corações com flechas? Eu costumava escrever no estrado da cama e nas portas dos guarda-roupas. Nós nos mudávamos muito quando eu era criança, deve vir daí a preocupação em carregar as histórias comigo e não deixá-la para trás, como eu vi nas paredes dessas casas que visitei. O mais engraçado é que os corretores, quando surpreendidos por esse tipo de detalhe, correm pra esclarecer: o proprietário se propôs a fazer uma pintura antes de entregar a casa! Claro, que ele se propõe. O que as pessoas querem quando se mudam? Imagino que, ainda que haja um motivo primário - benhê, arranjei outro emprego! - os secundários sempre trazem uma outra promessa tácita: página em branco. E isso significa paredes limpas. Vamos, tire logo essas memórias daí, que eu preciso gravar as minhas...

O mistério que faz alguém se encantar por determinados lugares. Entre três casas absolutamente iguais - ok, de cores diferentes - minha amiga escolheu seu novo lar, baseada em coisas como "eu fui muito com a energia daqui". Quem sou eu pra discordar? O mesmo não aconteceu com o marido dela, que aparentemente está em sintonia com outra residência. E tudo virou um inferno, um lenga-lenga chato demais. Que provavelmente vai terminar com eles se mudando para uma outra casa, que nenhum dos dois gostou muito, mas que pelo menos resolve a discussão. Será?


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